O adeus de Emília

Emília fechou o apartamento com a mochila nas costas e o gato nas mãos. Na caixa, claro, porque não dá pra viajar com gatos sem ser assim. Depois de dois anos, ela deixou Recife e voltou para a sua cidade Natal. Ninguém concordou. Ora, concordavam com ela que Recife era melhor do que Natal pra ela. Mas a teimosia de Emília era marca registrada da mulher. E ela voltou.

Naquele dia, tentou convencer a todos a ficar em casa. Mas a animosidade em torno dela já era demais por ter voltado. Os pais foram trabalhar, perto da lagoa. A irmã, de férias, foi à praia com o noivo e com o namorado de Emília – ele pediu folga no meio da semana e fez isso só pra maltratar a namorada, para mostrar que ela estava, no mínimo, louca. Emília pediu de novo a todos, ligou para todos, mas desligaram os celulares. Ninguém aguentava mais aquela conversa. Nem os mais próximos nem todos os parentes e amigos a quem implorou atenção.

A Emília só restou chorar e rezar. Subiu no telhado de casa com o gato.

Quando a água veio, não pôde deixar de se apavorar. Foi tudo muito rápido. O terremoto, o tsunami, o apagar do sol. Ela viu ao vivo e com muito mais intensidade o que tinha visto pela televisão, no Japão. E com toda a mudança que a hecatombe trouxe à terra, os alienígenas aproveitaram a bagunça e finalmente puderam entrar naquele planeta antes tão protegido por leis cósmicas ainda desconhecidas. A última coisa que Emília viu antes de voltar à razão foi um grande bloco de lama, carros, paus, pedras e gente vindo na direção de sua casa. Por sorte, ela lembrou de levar uma toalha e conseguiu uma carona para outro mundo.

Depois daquele 21 de dezembro de 2012, nunca mais se ouviu falar de Emília nem de outras 5.457.698.254 pessoas naquele planeta.

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A obra O adeus de Emília de Emídia Felipe foi licenciada com uma Licença Creative Commons – Atribuição – Uso Não Comercial – Obras Derivadas Proibidas 3.0 Não Adaptada.

O adeus de Emília

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